O USO DE JOGOS DE REGRAS NO ATENDIMENTO PSICOPEDAGÓGICO
Autores: Eliane Cawahisa; Geiva Calsa; Ivonilce Gallo; Luciana Lacanallo
Introdução
Em
decorrência do baixo desempenho dos alunos nas escolas, uma quantidade
cada vez maior de crianças tem chegado aos consultórios de
psicopedagogia apresentando dificuldades de aprendizagem em matemática.
Tanto na atuação clínica psicopedagógica quanto na atuação escolar
faz-se necessário um atendimento especializado nesta área de
conhecimento.
O desempenho que os alunos vêm demonstrando, sem
dúvida, justifica o desenvolvimento de uma metodologia de trabalho capaz
de promover uma aprendizagem significativa dos conceitos e
procedimentos matemáticos, em particular, nas primeiras séries do ensino
fundamental. Com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento de uma
aprendizagem significativa, este artigo visa apresentar uma experiência
de uso de jogos de regras na construção do conhecimento matemático.
Embora
desenvolvida no âmbito clínico psicopedagógico considera-se oportuna
sua ampliação para o meio escolar regular, desde que atendidos os
princípios teóricos e os critérios metodológicos de desenvolvimento da
atividade. O jogo da velha e o bafo foram os jogos convencionais
escolhidos como instrumentos terapêuticos da experiência aqui relatada.
Os Jogos sob um Enfoque Psicopedagógico
A
brincadeira e o jogo constituem-se uma necessidade humana e, segundo
Kishimoto (2000), interferem diretamente no desenvolvimento da
imaginação, da representação simbólica, da cognição, dos sentimentos, do
prazer, das relações, da convivência, da criatividade, do movimento e
da auto-imagem dos indivíduos. Muitos educadores desvalorizam a
brincadeira acreditando que o mais importante na escola é aprender a ler
e escrever.
Não levam em conta que todo o desenvolvimento que a
brincadeira traz para os indivíduos é pré-requisito para a
alfabetização. Vygotsky (1996) afirma que a brincadeira simbólica e o
jogo formam uma zona de desenvolvimento proximal que pode se constituir o
ponto de partida para aprendizagens formais.
Segundo Piaget
(1975), por meio do jogo a criança assimila o mundo para atender seus
desejos e fantasias. O jogo segue uma evolução que se inicia com os
exercícios funcionais, continua no desenvolvimento dos jogos simbólicos,
evolui no sentido dos jogos de construção para se aproximar,
gradativamente, dos jogos de regras, que dão origem à lógica operatória.
Segundo o autor, nos jogos de regras existe algo mais que a
simples diversão e interação, pois, eles revelam uma lógica diferente da
racional. Este tipo de jogo revela uma lógica própria da subjetividade
tão necessária para a estruturação da personalidade humana quanto a
lógica formal, advinda das estruturas cognitivas. Para Gonçalves (1999),
os jogos de regras podem ser considerados o coroamento das
transformações a que criança chega quando atinge a reversibilidade do
pensamento.
Ao tentar resolver os problemas originados no
desenvolvimento do jogo, o sujeito cria estratégias e as avalia em
função dos resultados obtidos e das metas a alcançar na atividade. Os
fracassos decorrentes destas ações originam conflitos ou contradições
por parte do indivíduo e desencadeiam mecanismos de equilibração
cognitiva (Brenelli, 1996).
As regulações ativas geradas por
este processo implicam decisões deliberadas dos indivíduos que originam
novos procedimentos de jogo. Apresentam um caráter construtivo e por
meio delas a retomada de uma ação é sempre modificada pelos resultados
da ação anterior em um processo contínuo de modificação das ações
seguintes, em função dos resultados das ações precedentes (MACEDO,
1994).
Brenelli (1996) assinala que conhecer os meios empregados
para alcançar o objetivo do jogo, bem como conhecer as razões desta
escolha ou de sua modificação, implica uma reconstrução no plano da
representação do que era dominado pelo sujeito como ação.
O
processo de tomada de consciência pode ser favorecido, dessa maneira,
pela verbalização dos procedimentos de jogo. Sob uma ótica
construtivista a verbalização envolve explicações sobre o que, como e
porque os sujeitos executaram seus procedimentos. A utilização da fala
organizada é capaz de favorecer a compreensão dos conceitos e
procedimentos contidos nas situaçõesproblema enfrentadas pelos sujeitos.
Em
uma intervenção de caráter psicopedagógico, o educador deve equilibrar
uma atuação mais e menos diretiva, conforme o tipo de tarefa a ser
realizada pelos sujeitos. Nas tarefas verbais sua atuação pode ser mais
diretiva, pois, tem como objetivo organizar a situação de aprendizagem e
solicitar a re-interpretação das ações e das falas dos sujeitos; nas
tarefas práticas pode ser menos diretiva, pois, seu objetivo é o de
apenas orientar a ação a ser efetivamente realizada pelo sujeito (CALSA,
2002).
Do ponto de vista psicopedagógico, o processo de
aprendizagem envolve não somente a fala do sujeito que aprende, mas
também a fala de quem ensina. Ao “pensar em voz alta” suas estratégias
de ação o educador atua como modelo de reflexão para o sujeito.
Utilizados tradicionalmente como recursos clínicos (VISCA, 1987), a fala
organizada e o uso do modelo têm obtido na escola resultados
satisfatórios no ensino de diferentes áreas de conhecimento (SOLÉ, 1998;
ZUNINO, 1995; CALSA, 2002).
A utilização do jogo de regras como
um recurso terapêutico ou escolar, seja por parte do psicopedagogo ou do
educador, exige conhecimento de sua estrutura e clareza dos objetivos a
serem atingidos. Macedo (1997) lembra que ao se propor um jogo é
preciso ter em mente o porquê de jogar, o que jogar, para quem, com que
recursos, de que modo jogar, quando e durante quanto tempo jogar, e qual
a continuidade desta atividade ao final de seu desenvolvimento.
Desenvolvimento das Intervenções Psicopedagógicas
Foram
escolhidos como sujeitos da intervenção duas crianças que procuraram
atendimento clínico psicopedagógico com dificuldades de aprendizagem na
área de matemática.
As crianças freqüentavam a 3a. e 4a. série
do ensino fundamental e apresentavam uma faixa etária entre 9 e 11 anos
de idade. Os dados obtidos nas sessões de atendimento psicopedagógico
foram registrados por escrito pelos terapeutas Elaboraram-se os
registros após cada sessão em que os jogos de regras foram utilizados.
As sessões foram realizadas individualmente com duração de 50 minutos
cada uma. A quantidade de sessões e sua periodicidade foram determinadas
pelo interesse dos sujeitos no desenvolvimento dos jogos.
Durante
o jogo se um jogador não conseguisse virar todas as fichas ou deixasse
uma ou mais, a vez seria do próximo participante. Se o jogador não
possuísse a soma determinada pelo seu adversário para fazer a aposta, o
valor que não possuído seria descontado da sua soma de pontos (os
resultados parciais devem ser anotados).
Se um dos jogadores
possuísse uma única carta com o valor superior à aposta feita pelo
adversário, ele poderia tentar trocá-la por fichas que representassem
essa quantidade. Caso um dos jogadores não tivesse mais o valor para
cobrir à aposta determinada pelo adversário ele ficaria com saldo
negativo que deveria ser pago no próximo jogo (o registro do saldo
negativo foi feito com anotações convencionais, por exemplo - 4 pontos).
Seria considerado vencedor quem conseguisse a maior soma no final da
partida.
Durante o processo de intervenção psicopedagógica os
jogos de regras foram desenvolvidos respeitando-se sua natureza
(estrutura interna), seus aspectos cognitivos, afetivos e sociais. Num
primeiro momento, optouse pelo ensino e desenvolvimento do jogo,
conforme seus materiais e regras convencionais. Após esta aprendizagem
novos elementos (numerais e operações) e regras foram introduzidos de
acordo com as dificuldades de aprendizagem de matemática a serem
atendidas em cada caso.
Resultados
Para a apresentação do
jogo do bafo optou-se pelo relato do caso clínico de J. P. (denominação
fictícia). As queixas da escola e da família quanto ao seu desempenho se
concentravam nos seguintes aspectos: não realizava cálculos mentais;
demonstrava possuir recursos intelectuais para realizar as tarefas de
matemática, mas não os utilizava; realizava tarefas escolares, sem
contudo dispor-se a refazê-las, no caso de estarem incorretas. Para
facilitar o acompanhamento das condutas de J. P. optou-se por dividir
suas respostas em etapas que permitem a percepção de seu crescimento
tanto em relação às estratégias de resolução quanto aos conteúdos de
matemática propriamente ditos. Os relatos dos jogos do bafo e da velha
iniciam-se a partir da introdução de novos elementos e regras à sua
estrutura convencional para o atendimento das dificuldades específicas
de cada um dos sujeitos em foco.
Na fase inicial de
desenvolvimento do jogo do bafo já com a introdução de conteúdos
matemáticos J. P. se preocupava apenas em virar as figuras o mais
precisamente possível sem se importar com a soma dos numerais presentes
em cada uma das fichas. Ele parecia estar associando as fichas que
utilizava neste jogo com as do jogo convencional, em que o valor de cada
ficha era definido pela força de seu personagem. Ao poupar as fichas de
maior valor - superiores a seis - demonstrava preocupação com a
quantidade de cartas de que dispunha no jogo. Jogava o bafo seguindo os
procedimentos do jogo convencional sem se dar conta das novas
estratégias originadas da introdução de numerais nas fichas.
Em
um segundo momento, J. P. começou a perceber que podia superar a
terapeuta na sua agilidade de virar as fichas, mas ainda assim não era
capaz de ganhar o jogo. Enquanto apostava fichas de valor baixo (1e2) a
terapeuta apostava fichas de valor maior que as absorviam. Suas apostas
baixas permitiam à terapeuta ganhar o jogo virando as fichas de maior
valor em que havia apostado. Nesta etapa a soma de pontos de J. P. era
sempre menor que a da terapeuta embora possuísse uma maior quantidade de
fichas que ela.
O terceiro momento do jogo do bafo
caracterizou-se pela percepção de J. P. de que a soma dos pontos de suas
fichas o estava impedindo de ganhar o jogo. Começou então a jogar
tentando alcançar a maior soma de pontos em cada virada. Para tanto,
passou a apostar com suas fichas de maior valor. A cada partida
examinava as fichas que possuía, verificava as que havia perdido e
organizava uma estratégia capaz de promover o saldo negativo para a
terapeuta.
No quarto e último momento de sua evolução no jogo J.
P. passou a apostar o maior número de fichas possível e, de preferência,
as de maior valor. Tornou-se capaz de levar em conta em sua estratégia
de jogo as duas variáveis ao mesmo tempo: quantidade de fichas e valor
de cada ficha apostada. A partir deste momento, preocupa-se em ganhar o
máximo de fichas e, ao mesmo tempo, atingir a maior soma possível de
pontos.
Para o desenvolvimento do jogo da velha escolheu-se o
caso clínico de F. P. (denominação fictícia). A queixa escolar e
familiar de seu desempenho concentrava-se nos seguintes pontos: não
compreendia o significado dos sinais das quatro operações básicas; não
se mostrava capaz de utilizar e compreender os algoritmos convencionais
de adição e subtração; encontrava-se na fase inicial de construção do
esquema multiplicativo e parecia ainda não ter avançado na construção do
esquema aditivo; ainda utilizava algoritmos intuitivos e representação
icônica tanto na adição quanto na subtração.
Da mesma
forma que no caso anterior, o relato das estratégias envolvidas no jogo
da velha se inicia a partir da introdução de elementos e regras
relacionadas ao conteúdo matemático no qual o sujeito apresentava
dificuldades de aprendizagem. Após esta aprendizagem novos materiais
(algarismos) e regras foram introduzidos de acordo com as dificuldades
de aprendizagem a serem atendidas no transcorrer do tratamento.
No
primeiro momento de atuação com o jogo da velha F. P. mostrou levar em
conta apenas os atributos espaciais do tabuleiro sem se ater ao outro
atributo, indispensável para a vitória - a soma dos algarismos.
Durante
esta fase fixava-se apenas uma das dimensões espaciais do jogo: a
diagonal. Utilizava sempre a mesma seqüência de colocação de suas fichas
sobre o tabuleiro. Costumava iniciar as partidas colocando suas fichas
em primeiro lugar sobre o canto inferior esquerdo do tabuleiro, em
seguida no centro, e, no final, no quadro central superior. Sua contagem
mostrava-se truncada e sempre acompanhada pelos dedos das mãos. Neste
momento, a organização de suas ações parecia não levar em consideração
as estratégias utilizadas pelo adversário.
No segundo momento do
uso do jogo da velha F. P. começou a organizar sua ação a partir da
dimensão numérica do jogo, embora persistisse sua preferência pela
dimensão espacial do tabuleiro. Manteve sua fixação em apenas uma de
suas dimensões espaciais, a diagonal, e sua estratégia de jogo quanto à
posição das fichas no tabuleiro, ainda sem levar em conta os movimentos
do adversário. Em uma das partidas desta fase, acabou por ganhar o jogo,
mas suas ações não se constituíram reações ou antecipações aos
movimentos do adversário e, sim, a repetição de uma seqüência de passos
previamente testados. Ainda nesta fase, a escolha das fichas a serem
colocadas no tabuleiro foi aleatória, pois, ignorou a dimensão numérica
do jogo. Ao vencer a partida não somente quanto à posição das fichas,
mas também na contagem de seus pontos deu-se conta da importância do
número da ficha utilizada em sua última jogada. Sua contagem continuou
truncada e acompanhada dos dedos das mãos.
Na terceira fase do
atendimento com uso do jogo da velha F. P. manifestou um grande avanço
na elaboração e execução de suas estratégias de jogo. Passou a
preocupar-se com as duas dimensões envolvidas no jogo: espacial e
numérica e começou a perceber mais claramente as razões das vitórias
consecutivas de seu adversário.
Apresentou uma pequena variação
em sua estratégia de jogo. Iniciou uma das partidas desta fase do mesmo
modo que as anteriores, mas acrescentou mais uma posição à sua
finalização: o canto superior direito do tabuleiro. Sua opção por uma ou
outra posição da ficha no final do jogo passa a depender dos movimentos
do adversário.
Esta opção caracteriza-se como uma reação ao movimento do adversário e, portanto, posterior a este.
Nesta
partida, em suas duas primeiras jogadas optou novamente por fichas com
números baixos, mas ao final percebeu que, embora tenha vencido quanto à
posição das fichas no tabuleiro perdeu em sua contagem de pontos.
Deu-se conta de que a diferença de pontos obtidos na partida foi
conseqüência das fichas escolhidas pelos dois jogadores. A partir daí
passou a observar as quantidades presentes nas fichas utilizadas pelo
terapeuta, bem como a seqüência em que foram jogadas. Sua contagem ainda
permaneceu truncada e acompanhada dos dedos das mãos.
Na última
etapa do jogo da velha F.P. modificou suas estratégias de jogo e passou a
utilizar cartas com números maiores em pontos estratégicos do
tabuleiro. As estratégias do adversário tornaram-se modelos de ação.
Passou a utilizar fichas de maior valor desde as primeiras jogadas de
cada partida e, ao mesmo tempo, a apresentar um maior conjunto de
variações das posições das fichas no tabuleiro. As jogadas eram
iniciadas e finalizadas em diferentes posições do tabuleiro, pois, a
estratégia de jogo era organizada não somente como reação aos movimentos
do adversário, mas também como antecipação a eles.
Em uma das
partidas desta fase o sujeito iniciou o jogo no canto superior direito,
seguiu para o canto superior esquerdo e previu a possibilidade de vencer
fechando uma seqüência na lateral esquerda do tabuleiro. Para isto,
ignorou a ficha colocada pelo adversário no quadro central do tabuleiro e
jogou sua ficha na posição central esquerda e, logo após, venceu o jogo
fechando uma seqüência no canto inferior esquerdo.
Ao vencer a partida confirmou sua previsão quanto à melhor estratégia adotada nesta situação.
Nos
dois casos relatados os sujeitos modificaram suas estratégias de jogo
tornando-as operatórias. As estratégias utilizadas no início do
desenvolvimento dos dois jogos caracterizaram-se pela preocupação com
apenas uma das variáveis envolvidas na atividade de cada vez.
Ao
longo do processo de evolução de suas estratégias os sujeitos
privilegiaram a cada momento apenas uma das dimensões do jogo. No jogo
da velha, no primeiro e segundo momento, F. P. levou em conta apenas sua
dimensão espacial para, no terceiro momento, priorizar sua dimensão
numérica, e apenas no último momento, levar em conta as duas dimensões
ao mesmo tempo. No jogo do bafo, no primeiro e segundo momento, J.P.
levou em conta apenas a quantidade de fichas viradas para, no terceiro
momento, priorizar a soma dos numerais contidos nas fichas, e apenas no
último momento, levar em conta as duas dimensões ao mesmo tempo:
quantidadede fichas apostadas e viradas e soma dos numerais contidos nas
fichas.
Conclusões
Os resultados do experimento
evidenciam os progressos obtidos pelos sujeitos submetidos à abordagem
psicopedagógica dos conteúdos matemáticos e dos jogos convencionais
escolhidos, bafo e jogo da velha.
Nos dois casos relatados,
constatou-se evolução de suas estratégias de jogo e de seus
conhecimentos sobre as operações de adição e subtração.
As
estratégias iniciais dos dois jogadores demonstravam umaconduta
indiferente aos elementos matemáticos introduzidos nos jogos e
organizavam suas jogadas, conforme os procedimentos convencionalmente
utilizados nos dois jogos.
No jogo do bafo J.P. preocupava-se
apenas em virar as figuras o mais rápido possível, enquanto no jogo da
velha F.P. fixava-se em uma das dimensões espaciais do tabuleiro, a
diagonal.
Ao lidar com apenas uma das duas dimensões implicadas
nos jogos os sujeitos evidenciaram uma conduta não operatória, embora a
tivessem manifestado em outras situações1.
Em uma etapa posterior
os dois jogadores passaram a levar em conta a dimensão numérica dos
dois jogos abandonando temporariamente a dimensão espacial. A utilização
da dimensão numérica nos jogos, embora de maneira restrita, sugere a
manutenção de sua conduta não operatória.
A última etapa de
evolução das estratégias de jogo dos sujeitos representou a utilização
de diferentes variáveis contidas tanto na dimensão numérica dos jogos –
no jogo do bafo quantidade de fichas, valor de cada uma e sua soma, e no
jogo da velha o valor de cada ficha e sua soma, quanto em sua dimensão
espacial – no jogo da velha a posição diagonal, horizontal e vertical
das fichas.
Em provas piagetianas aplicadas aos dois sujeitos observou-se a manifestação do estágio de pensamento operatório concreto.
O
novo comportamento introduzido nos dois jogos evidenciou uma conduta
operatória nos procedimentos dos dois jogadores. Ao beneficiar-se de sua
operatoriedade na organização das estratégias de jogo os sujeitos
indicaram ter sido capazes de utilizar adequadamente seus recursos
cognitivos. A ativação pertinente dos recursos cognitivos disponíveis em
seu sistema cognitivo é um dos indicadores, segundo Perrenoud (1999),
do desenvolvimento de competências por parte dos indivíduos.
Os
progressos obtidos pelos dois jogadores ao longo do experimento
demonstram a importância da abordagem psicopedagógica da matemática e
dos jogos convencionais para a melhoria do desempenho dos sujeitos nas
duas áreas. Além de modificar suas estratégias de jogo, os sujeitos
modificaram suas estratégias de soma das quantidades contidas nas fichas
de jogo e dos pontos obtidos nas partidas.
Ambos deixaram de
realizar esta operação por meio da contagem dos dedos e passaram a
efetuá-la por meio do cálculo mental. Tais resultados confirmam os
obtidos em estudos anteriores por Brenelli (1996) e Calsa (2002).
Brenelli
(1996) observou que a abordagem psicopedagógica dos jogos de regras
favorece o desenvolvimento das estruturas cognitivas, pois, permite que o
sujeito realize descentrações e coordenações de pontos de vista, bem
como, o desencadeamento de regulações ativas no processo de escolha de
procedimentos adequados ao alcance dos objetivos do jogo.
Em seu
estudo, realizado com crianças de faixa etária equivalente ao deste
relato, a autora constatou que ao modificar sua maneira de jogar a
criança mostra que foi capaz de compensar as perturbações provocadas
pelo jogo, na tentativa de se acomodar às suas exigências. Dessa
perspectiva, podese afirmar que por meio do jogo o sujeito exercitou
suas funções intelectuais de assimilação e acomodação, fatores, em
parte, responsáveis pelo desenvolvimento cognitivo dos sujeitos.
Calsa
(2002), em outro estudo com faixa etária equivalente ao desta pesquisa,
concluiu que a abordagem psicopedagógica de conteúdos matemáticos é
capaz de melhorar o desempenho de alunos com rendimento insatisfatório
nesta matéria. Durante o processo de intervenção os alunos apresentaram
um movimento de retomada de formas mais primitivas de resolução de
tarefas para, ao longo do processo, chegar até formas mais avançadas e
compatíveis com sua faixa etária.
Finalizando, é importante
assinalar que os resultados da experiência relatada neste artigo mostram
a importância de intervenções de caráter psicopedagógico para a
modificação do modelo de aprendizagem dos indivíduos em situação
terapêutica, e sugerem sua viabilidade em situação escolar para a
melhoria da aprendizagem de seus alunos.
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