A Vitória Régia
O
rio Amazonas abrigava às suas margens várias tribos de índios. Das águas do
grande rio uma das tribos tirava o peixe para o seu sustento. Vários igarapés
delimitavam as ilhas que se formavam ao redor do rio, e neles as moças da aldeia
cantavam as mais belas canções, e sonhavam os mais belos sonhos. Dentre os
sonhos das cunhãs, o de tocar a lua e as estrelas era o mais persistente.
Na
aldeia as mães contavam para as filhas que quem tocasse a lua ou uma estrela,
teria o brilho delas sobre o corpo, transformando-se em uma. Assim as jovens
cunhãs sonhavam em tocar a lua. Suspiravam quando ela mostrava-se majestosa no
céu, em sua fase plena.
De todas as cunhãs, Neca-Neca era a mais bela, a mais
sensível e a mais sonhadora. Seus longos cabelos negros exalavam um perfume doce
e embriagante. Os homens da aldeia sonhavam em conquistar o seu coração. Mas
Neca-Neca só pensava em alcançar a lua e tocá-la, aprisioná-la entre os dedos e
embriagar-se na sua luz redentora. A jovem índia sonhava em ser uma estrela, e
poder iluminar todos os mistérios do mundo, tendo a lua como amiga.
Várias
foram as tentativas de Neca-Neca de tocar a lua. Subiu na mais alta árvore da
selva, mas a lua continuava distante. Ao lado de outras amigas, caminhou na
direção do mais alto dos morros. Exausta, chegou ao topo da montanha e viu a lua
ainda mais distante. Desolada, voltou para a aldeia acometida da mais profunda
tristeza. Deitou-se na rede e embalou a amargura de não poder tocar a lua. Um
dia ainda seria uma estrela, ou mesmo a própria lua. Adormeceu triste, mas sem
deixar de perseguir o seu sonho pertinente.
Numa noite de lua cheia,
Neca-Neca pôs-se às margens do grande Amazonas. Ao mirar as águas misteriosas do
rio, viu que lá estava a lua, silenciosa, imóvel. A cunhã sorriu vitoriosa. O
seu sonho estava próximo. Perseguira a lua nos lugares mais altos da mata, agora
ela estava ali, mansa e à mão, a banhar-se nas águas do grande rio, pronta para
satisfazer-lhe o sonho. Neca-Neca finalmente tocaria a lua. Sem pensar duas
vezes, atirou-se às águas em busca da lua. Quanto mais tentava tocar o astro
prateado, mais se afundava e encontrava apenas a escuridão do mundo. Mergulhada
no seu sonho, Neca-Neca foi tragada pelo rio Amazonas.
Do alto do céu, a lua
assistiu ao embuste que embriagara o sonho da jovem índia. Apiedada da tragédia
de Neca-Neca, a lua prateada transformou-a em uma flor. Mas não em uma flor
comum, e sim na maior e mais bela de todos as flores do mundo, a
vitória-régia.
No meio do rio Amazona, Neca-Neca, transformada na
vitória-régia, exala o mais delicado de todos os perfumes, inebriando os homens
e os animais que assistem às suas pétalas estiradas à flor da água, pronta para
receber os raios da lua. Nas noites de lua cheia, as cunhãs aparecem no meio da
flor, dando-lhe um brilho eterno. Nessas noites, o brilho da lua forma um véu
prateado a cobrir todas as flores do lago, que são mulheres transformadas em
estrelas das águas, sob o feitiço e a piedade da lua, iluminando as noites
tropicais.
Adaptação livre de Jeocaz Lee-Meddi para textos de
Brasil, Histórias, Costumes e Lenda
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